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Críticas 2016


O Vale do Amor - História inusitada, protagonizada por dois ícones do cinema francês
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 13/10/2016)



Em O Vale do Amor, o diretor Guillaume Nicloux (A Religiosa) junta dois ícones do cinema francês: Isabelle Huppert e Gérard Depardieu.

Eles são os protagonistas de uma história inusitada sobre um ex-casal que se reencontra depois de vários anos para realizar o último desejo do filho que se suicidou. Antes de morrer, ele deixou uma carta para cada um dos pais pedindo a eles que o encontrem no "Vale da Morte", uma região árida localizada ao norte do Deserto de Mojave, na Califórnia (EUA). Nas cartas o filho pede ainda que eles visitem sete pontos específicos na região durante sete dias consecutivos porque em um desses locais ocorrerá o encontro.

A mãe abraça a ideia sem questionamentos, na esperança de rever o filho que abandonou aos sete anos de idade e assim aplacar o seu remorso. Já o pai, que também se culpa por ter deixado o filho num colégio interno após a separação, é mais cético.

Seguindo as orientações contidas nas cartas, os dois iniciam uma jornada de expiação de suas culpas ao mesmo tempo em que vão aos poucos se reaproximando. Envolvidos pela solidão e pelo calor do deserto eles mantém longas conversas, enquanto esperam pela aparição do filho morto. Nessas conversas eles abordam não só os seus sentimentos com relação ao filho que ambos renegaram, mas também comentam sobre o passado e sobre os rumos que suas vidas tomaram (ambos se casaram novamente e constituíram outras famílias).

Curiosamente eles interpretam dois atores franceses, que levam os mesmos nomes de seus intérpretes, ou seja: Isabelle e Gérard.

Os dias vão passando sem novidades, até que numa certa noite Gérard é surpreendido pelos gritos que vem do quarto de Isabelle. Ele arromba a porta e encontra a mulher apavorada, jurando que acabara de receber a visita do filho. Porém, uma busca minuciosa no aposento revela que não havia mais ninguém ali.

Gérard insiste que tudo não passou de um sonho, até que ele mesmo experimenta algo parecido: ao subir sozinho numa montanha, num dos locais indicados na carta, ele ouve alguma coisa, desaparece por algum tempo e quando retorna para a companhia da ex-mulher afirma ter visto o filho.

Teriam os pais realmente feito contato com o filho morto? Ou foram apenas alucinações, provocadas por uma combinação de fatores (o sentimento de culpa que ambos nutriam, o poder de sugestão das cartas recebidas e o ambiente do deserto)? E como explicar as misteriosas marcas que apareceram nos tornozelos de Isabelle e nos pulsos de Gérard, justamente nas partes do corpo onde segundo eles, foram tocados pelo filho? São questões que o filme levanta mas não responde, deixando para o espectador a decisão de acreditar ou não nos relatos dos personagens.

Diante disso, o melhor a se fazer é deixar-se levar pela história e aproveitar a chance de ver dois grandes atores como Isabelle Huppert e Gérard Depardieu atuando juntos. Só isso já vale o ingresso.

Avaliação: Bom. Nota: 8,5/10.


Imagem: Vista do Vale da Morte, local onde se passa a trama do filme.

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Sete Homens e um Destino – Faroeste genérico e sem personalidade
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 06/10/2016)



Numa época em que os faroestes praticamente sumiram das telas dos cinemas, o lançamento desta refilmagem do clássico Sete Homens e um Destino chama a atenção. Porém, ainda não será desta vez que este tipo de filme reviverá os seus dias de glória do passado, pois embora o longa traga vários ingredientes dos faroestes tradicionais, falta-lhe personalidade. Durante a projeção até me ocorreu que um diretor mais ousado como Quentin Tarantino por exemplo, poderia ter transformado essa história num filme mais interessante, algo no estilo de Django Livre ou de Os Oito Odiados.

O filme Sete Homens e um Destino original, lançado em 1960, continua sendo uma referência para os fãs de westerns. Ele nasceu a partir de uma sugestão do ator Yul Brynner ao produtor Walter Mirisch de adaptar para o gênero faroeste o clássico de Akira Kurosawa, Os Sete Samurais (1954). Além de contar com um bom elenco composto por nomes como Yul Brynner, Steve McQueen, Eli Wallach, James Coburn, entre outros, o filme ainda se beneficiou com a trilha sonora inspirada de Elmer Bernstein, cujo tema marcante é reconhecido até os dias de hoje. Numa entrevista que concedeu em 1990 o diretor do longa John Sturges revelou que o compositor escolhido inicialmente para o projeto foi Dimitri Tiomkin, porém diretor e compositor se desentenderam e Bernstein foi chamado. O filme teve três continuações: A Volta dos Sete Homens (1966), A Revolta dos Sete Homens (1969) e A Fúria dos Sete Homens (1972).

A nova versão de Sete Homens e um Destino (2016) dirigida por Antoine Fuqua (Dia de Treinamento, Rei Arthur, Nocaute) repete basicamente a premissa do original: os habitantes de um vilarejo são ameaçados por um poderoso malfeitor e contratam um grupo de pistoleiros para protegê-los.

A obra apela constantemente para a suspensão da descrença por parte do espectador, ou seja, para a sua disposição de aceitar certas situações impossíveis, como por exemplo: nos diversos tiroteios que ocorrem durante a trama, os bandidos (aparentemente ruins de mira) são eliminados com a maior facilidade, enquanto que os mocinhos escapam quase sempre ilesos e mesmo no confronto final, quando eles são atingidos, custam para morrer (alguns deles, mesmo crivados de balas ou de flechas, ainda conseguem reagir).

Mas como as sequências de ação são tecnicamente bem feitas, até dá para relevar algumas situações forçadas. A maior falha do filme entretanto, está na sua incapacidade de fazer o espectador se afeiçoar aos personagens, sejam os moradores do vilarejo que está sendo ameaçado, sejam os sete pistoleiros que os ajudam, pois todos são desenvolvidos de forma superficial. Mesmo atores bons e conhecidos como Denzel Washington e Ethan Hawke estão apagados neste filme. Já o ator Peter Sarsgaard, que interpreta o vilão Bartholomew Bogue, tira proveito do seu olhar e da sua expressão facial naturalmente enigmáticos e constrói um vilão com jeito de psicopata.

A forma como o grupo dos sete pistoleiros é constituído também é pouco trabalhada pelo roteiro. Não ficam muito claros os motivos pelos quais alguns deles entram para o grupo, deixando a impressão de que era preciso preencher as sete vagas de qualquer jeito para assim justificar o título do filme.

Para os amantes da música de cinema no entanto, o longa terá um significado especial, pois trata-se do último trabalho do compositor James Horner, que morreu em junho de 2015 em um desastre aéreo, antes do filme ser completado. Horner havia escrito vários temas para o filme, que acabaram sendo adaptados pelo compositor e arranjador Simon Franglen.

Sem trazer nenhuma novidade que pudesse revitalizar o gênero, essa nova versão de Sete Homens e um Destino é apenas um faroeste genérico. Ele até garante um certo nível de entretenimento, mas não vai muito além disso.

Avaliação: Regular. Nota: 6,5/10.

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Francofonia - Louvre Sob Ocupação – Sokurov utiliza a História e a Arte como matérias-primas de seu novo filme
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 13/09/2016)



Na saída da sessão de Francofonia - Louvre Sob Ocupação encontrei um conhecido e perguntei a ele o que tinha achado do filme.

Ele me respondeu que o filme lembrava Arca Russa.

Concordei com ele e comentei que por ser um grande fã de Arca Russa, eu tinha adorado Francofonia também.

É verdade que este novo trabalho do diretor russo Aleksandr Sokurov tem alguns pontos em comum com Arca Russa (o longa que ele lançou em 2002, famoso por ter sido filmado em um único plano sequência): em ambos os casos a história é conduzida por um narrador (cuja voz é a do próprio diretor), eles tem como cenário principal um museu, que é visitado por figuras históricas, e dedicam parte de suas narrativas à contemplação de obras de arte. Mas é importante ressaltar que não se trata de mera contemplação, Sokurov utiliza esse recurso para explorar as relações entre arte e poder, e também para fazer um registro da História.

Se em Arca Russa o cineasta nos levava numa viagem pelo passado da Rússia, com direito a acompanharmos Catarina a Grande (entre outras figuras ilustres) caminhando pelos corredores e salões do Museu Hermitage, em São Petersburgo, em Francofonia ele lança o seu olhar sobre o Museu do Louvre para contar o que se passou com esse importante símbolo da França quando a cidade de Paris foi ocupada pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Dentre as figuras importantes que Sokurov resgatou do passado desta vez está Napoleão Bonaparte, que vem reivindicar para si o mérito pela formação do acervo do museu.

O objetivo do diretor em ambos os filmes parece ser o mesmo: fazer uma reflexão e um balanço da História.

Mas não quero deixar no leitor a impressão de que Francofonia é uma cópia de Arca Russa. Apesar das semelhanças que foram mencionadas até aqui, os dois filmes são obras distintas. Até porque cada um tem o seu próprio objeto de estudo: um foca na Rússia Imperial e o outro na Europa da Segunda Guerra.

Francofonia – Louvre Sob Ocupação mistura elementos de documentário e ficção, presente e passado, e é narrado a partir do tempo presente pelo próprio Sokurov, que aparece em seu escritório tentando manter contato pela internet com um tripulante de um navio. Trata-se de uma situação tensa porque o navio está transportando obras de arte e uma forte tempestade em alto mar ameaça a embarcação e sua preciosa carga. Sokurov utiliza essa situação do presente para chamar a atenção para um outro momento no passado em que obras de arte valiosas estiveram ameaçadas, desta vez não pelas forças da natureza, mas pela guerra. Felizmente, no caso do Louvre tudo acabou bem, pois o seu diretor Jacques Jaujar e o oficial da ocupação nazista Count Franziskus Wolff-Metternich se uniram para preservar o grande acervo de obras do museu. Já os monumentos e obras de arte das cidades soviéticas que foram invadidas pela Alemanha não tiveram a mesma sorte, conforme denuncia o diretor neste filme.

Mas não é só com figuras históricas conhecidas como Bonaparte, Jaujar, Metternich, além do próprio Hitler (visto em imagens feitas na época da guerra) que Sokurov constrói a narrativa de Francofonia, ele também utiliza um grande número de fotos e imagens de pessoas comuns, anônimas que viveram naquela época e as expressões de seus rostos ajudam o diretor a retratar os sentimentos (medo, apreensão, desesperança, etc) que tomavam conta das pessoas naqueles tempos difíceis e conturbados.

Filho de um ex-combatente da Segunda Guerra Mundial, formado em História e com uma carreira que inclui dezenas de documentários, Sokurov era o cineasta perfeito para fazer este tipo de filme e o resultado final não poderia ser diferente: Francofonia – Louvre Sob Ocupação é uma obra fascinante.

Assim como o Dr. Johann Georg Faust (personagem do filme Fausto, que Sokurov dirigiu em 2011), que na sua ânsia por conhecimento dissecava cadáveres em busca da alma humana, em Francofonia Sokurov disseca a História para buscar um significado por trás dos fatos que estão sendo retratados.

Avaliação: Ótimo. Nota: 10/10.

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Star Trek - Sem Fronteiras – Sobram cenas de ação e efeitos especiais, mas falta uma boa história
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 09/09/2016)



Não me considero exatamente um "Trekker", ou seja, um fanático por Star Trek, mas estou bastante familiarizado com este universo, uma vez que venho acompanhando as aventuras da tripulação da Enterprise desde a época da antiga série de TV. Por isso fiquei tão decepcionado com este novo filme, por trás do pomposo título "Star Trek – Sem Fronteiras" está um dos piores filmes da franquia Jornada nas Estrelas.

Logo na primeira cena, que mostra o capitão Kirk sendo atacado por um bando de monstrinhos digitais, eu já tive um mau pressentimento.

Em seguida veio outra situação que me incomodou bastante: uma alienígena é resgatada pela estação espacial onde a Enterprise está acoplada e pede ajuda para salvar os seus companheiros que estão presos num planeta próximo a uma nebulosa desconhecida. Tendo como base somente esse breve relato, o capitão Kirk e sua tripulação se lançam numa missão de resgate sem ao menos checarem quem é aquela criatura ou se a história que ela contou é verdadeira. É evidente que se trata de uma armadilha, e o fato de todos caírem numa armadilha tão óbvia, demonstra não só a falta de cuidado dos roteiristas, como também menosprezo pela inteligência do espectador, e como se isso não bastasse, ainda compromete a imagem do personagem James T. Kirk, que sempre teve a perspicácia como uma de suas principais características. Ainda que essa situação tenha como objetivo levar a tripulação da Enterprise até o território do inimigo e assim iniciar a história do filme propriamente dita, ela deveria ter sido melhor elaborada.

Se o capitão fosse um principiante até poderíamos relevar essa sua atitude impensada, mas estamos falando de um dos mais importantes comandantes da frota estelar, assessorado por profissionais competentes. Mesmo que ele estivesse entediado por passar tantos anos no espaço, cometer um erro tão primário como esse é algo que não combina com a biografia do personagem. Talvez se os roteiristas não estivessem tão preocupados em criar piadinhas para as falas dos personagens, tivessem se atentado para este fato.

Aliás, por falar em biografia, no filme anterior da franquia, Star Trek – Além da Escuridão, já tinham tentado transformar o personagem Spock em uma espécie de Rambo, que diante das dificuldades não hesitava em abandonar as soluções baseadas na lógica e partia pra porrada. Assim os roteiristas, aparentemente sob o patrocínio de J.J. Abrams, vão desvirtuando pouco a pouco as características mais marcantes dos personagens, fazendo com que a cada novo filme eles se transformem mais e mais em meros acessórios das sequências de ação. Eles estão ficando tão superficiais, que a gente nem consegue mais temer pelo destino deles (confesso que se o Capitão Kirk, Spock ou qualquer outro membro da tripulação tivesse morrido neste terceiro filme eu nem teria me importado).

Como se não bastasse a pouca qualidade do roteiro, a direção é fraca e sem criatividade. O diretor Justin Lin (originário da franquia Velozes & Furiosos) talvez entenda de filmar corridas de carros, mas em Star Trek – Sem Fronteiras, além de conduzir a trama de forma totalmente previsível, ele consegue transformar as sequências de ação e as batalhas espaciais numa grande confusão. O ritmo exageradamente frenético, as perseguições, as explosões e os tiros de phasers vindos de todos os lados, tudo ocorrendo ao mesmo tempo, me deixaram completamente desorientado – durante essas sequências, as vezes era difícil saber exatamente o que estava acontecendo.

Sem Fronteiras traz também um dos vilões mais insignificantes de toda a franquia: Krall (interpretado pelo ator Idris Elba, irreconhecível por trás de uma pesada maquiagem) fica fazendo cara de mau o tempo todo, mas não consegue amedrontar ninguém. Atormentado por uma mágoa do passado, ele pretende se vingar dos povos que fazem parte da Federação e passa uma boa parte do filme atrás de um tal artefato chamado Abronath, cujos poderes podem ajuda-lo no seu plano de destruição. Krall tem como principal arma um exército de pequenas espaçonaves que juntas se comportam como um enxame de abelhas, num ataque conjunto elas são capazes de rasgar a fuselagem de uma nave espacial em segundos. Mas como nesse filme nada é explicado de forma satisfatória, não fica muito claro como essas naves funcionam, parece que elas se comunicam umas com as outras por meio de uma frequência especial, o que garante o sincronismo de seus movimentos. A ideia que está por trás dessas naves até que é interessante, já a solução simplista que os roteiristas encontraram para que o capitão Kirk e cia. pudessem desorienta-las e destrui-las no confronto final não convence muito.

Gosto muito do reboot Star Trek, lançado em 2009 e dirigido por J.J. Abrams, penso que com esse filme ele conseguiu revitalizar a franquia e até deixar os fãs ansiosos pelos próximos filmes que viriam. Porém, as duas continuações que se seguiram, Além da Escuridão (2013) e Sem Fronteiras (2016), se mostraram decepcionantes na minha opinião e me deixaram a impressão de que a capacidade dos realizadores de explorarem o universo de Star Trek se esgotou, em ambos os filmes sobram cenas de ação e efeitos especiais, mas falta uma boa história.

O fato de Star Trek – Sem Fronteiras ter apresentado um desempenho aquém do esperado nas bilheterias talvez sirva de alerta para que os realizadores reflitam sobre os rumos da franquia. Afinal, quando o momento mais emocionante de um filme ocorre após o seu término (refiro-me a homenagem feita a Leonard Nimoy e a Anton Yelchin durante a subida dos créditos finais) é porque há algo de errado com ele.

Avaliação: Péssimo. Nota: 0/10.

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O Bom Gigante Amigo – Filme revela um Spielberg infantilizado
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 28/08/2016)



Steven Spielberg iniciou a sua carreira nos anos 60 dirigindo curtas-metragens, séries e filmes para a televisão. Chegou a dirigir episódios de séries famosas como Galeria do Terror e Columbo, mas foi em 1971 que ele chamou a atenção do público e da crítica com o telefilme Encurralado, um thriller sobre um homem que é perseguido implacavelmente por um misterioso caminhoneiro pelas rodovias desertas do oeste americano.

Em 1974 Spielberg estreou na telona com o drama Louca Escapada e no ano seguinte fez Tubarão, o filme que o catapultou para a fama. Na sequência vieram Contatos Imediatos do Terceiro Grau, 1941, Caçadores da Arca Perdida, E.T. - O Extraterrestre e Indiana Jones e o Templo da Perdição. Com essa filmografia, Spielberg se tornou nos anos 80 o nº 1 do cinema de entretenimento.

Na metade da década de 80, o cineasta decidiu dar uma guinada em sua carreira e começou a investir em filmes com temáticas mais sérias e voltados para o público adulto (embora nunca tenha abandonado completamente os filmes de entretenimento). Dessa fase "séria" nasceram filmes como A Cor Púrpura (1985), Império do Sol (1987) e o melhor filme do diretor na minha opinião, e o ponto alto da sua carreira: A Lista de Schindler (1993). Filme que lhe deu finalmente o Oscar de melhor direção.

Desde então, Spielberg vem mantendo uma carreira bastante eclética, alternando filmes de ficção científica, dramas baseados em fatos reais, entre outros gêneros, mas sem conseguir repetir o mesmo sucesso estrondoso do passado.

Em 2015 o diretor pareceu ter voltado à boa forma com o interessante Ponte dos Espiões, mas em seguida fez este O Bom Gigante Amigo, que considero um de seus piores trabalhos.

Baseado num livro de Roald Dahl, cujas obras já serviram de inspiração para outros filmes como A Fantástica Fábrica de Chocolate e O Fantástico Sr. Raposo, O Bom Gigante Amigo é uma fantasia sobre uma pequena órfã que é raptada por um gigante bonzinho e sensível apelidado de BFG (Big Friendly Giant) que vive numa terra cheia de gigantes malvados. BFG tem a habilidade de capturar sonhos, os quais ele introduz nas mentes dos humanos durante a noite enquanto eles dormem. O personagem digital ganhou vida por meio da atuação do ator Mark Rylance, em combinação com a já conhecida técnica de captura de movimentos (a mesma utilizada para criar o personagem Gollum, de O Senhor dos Anéis).

Nas mãos do diretor Steven Spielberg e da roteirista Melissa Mathison, porém, essa história se transformou em algo totalmente inverossímil. De um lado temos um diretor infantilizado, de outro um roteiro que não consegue desenvolver situações minimamente convincentes (mesmo lidando com um universo fantasioso). Só para dar um exemplo: a pequena órfã e o gigante utilizam alguns sonhos capturados na tentativa de convencerem a Rainha da Inglaterra a enviar o seu exército para dar uma lição nos gigantes malvados, só que, pasmem, nem a rainha e nem as demais pessoas no palácio demonstram qualquer surpresa quando descobrem a existência de gigantes. Ou seja, para conseguir engolir essa e tantas outras situações absurdas que o filme apresenta, só desligando totalmente o senso crítico, o que eu não consegui fazer.

Eu até cheguei a questionar se o problema não era comigo, pois como adulto talvez eu tenha ficado um pouco insensível a esse tipo de filme, mas daí me lembrei que até hoje eu me encanto e me emociono quando revejo A Fantástica Fábrica de Chocolate, baseada na obra do mesmo autor (me refiro, é claro, a aquela primeira versão de 1971 com Gene Wilder e não a refilmagem fria e esquisita dirigida por Tim Burton em 2005).

Para piorar ainda mais a situação, esse parece ser um daqueles projetos da Disney pertencentes a categoria "Filme para toda a família", ou seja, tudo tem que ser certinho, bonitinho e acabar com um meloso final feliz. Todo mundo sabe, por exemplo, que os gigantes malvados raptam as criancinhas para comê-las, mas obviamente esse fato nunca é explicitado no filme.

Outro forte indicativo de que Spielberg errou a mão nesse trabalho é que ao longo de sua carreira o diretor ficou conhecido pelo seu talento em dirigir crianças, fazendo com que elas atuassem sempre com naturalidade diante das câmeras (podemos destacar os casos de Henry Thomas e Drew Barrymore em E.T. - O Extraterrestre, Jonathan Ke Quan em Indiana Jones e o Templo da Perdição, Christian Bale em Império do Sol e Haley Joel Osment em A.I.: Inteligência Artificial). Pois bem, em O Bom Gigante Amigo, Spielberg falha na tentativa de recriar as suas bem sucedidas parcerias com atores mirins do passado. Embora a atriz Ruby Barnhill seja bonita e graciosa, ela não consegue estabelecer o mesmo nível de empatia com o público, que as outras crianças que foram dirigidas por Spielberg conseguiram.

Nem a sempre perfeita parceria entre o diretor e o compositor John Williams consegue escapar sem críticas neste filme. Talvez, por não conseguir criar o universo mágico requerido pela história somente por meio do roteiro e do visual, o diretor tenha exagerado na utilização da trilha sonora, que é onipresente durante toda a narrativa, e este excesso acaba incomodando o espectador. Foi o que aconteceu comigo: embora eu seja um grande fã de John Williams e considere a música que ele compôs para este filme muito bonita, me lembro que durante a projeção eu era tomado por uma imensa sensação de alívio toda vez que a música parava de tocar (posso estar enganado, mas eu registrei somente umas 3 ou 4 pausas durante todo o filme).

Como eu não li o livro de Roald Dahl, não sei se ele busca passar alguma mensagem para o leitor. Mas no caso deste filme posso assegurar que ele não passa mensagem alguma.

Finalizo essa crítica desejando que Steven Spielberg seja mais feliz nos seus próximos projetos e que a Disney repense o seu conceito de "Filmes para toda a família" para assim nos poupar de outros produtos descartáveis como esse O Bom Gigante Amigo.

Avaliação: Péssimo. Nota: 1/10.

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Ben-Hur – Já não se fazem mais épicos como antigamente
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 21/08/2016)



Ben-Hur (2016) é a quarta adaptação cinematográfica do romance "Ben-Hur: Um Conto do Cristo", escrito em 1880, por Lew Wallace.

A primeira adaptação foi feita em 1907, na forma de um curta-metragem de 15 minutos. Depois houve uma segunda versão produzida em 1925 por Louis B. Mayer, na época do cinema mudo. Mas a versão mais bem sucedida foi a lançada em 1959. O filme dirigido por William Wyler e estrelado por Charlton Heston se tornou um dos mais premiados do cinema norte-americano, ganhando nada menos que 11 Oscars.

Ben-Hur narra a história de Judah Ben Hur, um judeu pertencente a uma família nobre de Jerusalém que tenta se manter neutro com relação ao crescente domínio de Roma na região. Ele é muito apegado ao irmão adotivo Messala, que tem origem romana. Como se sente inferiorizado por não ter as mesmas raízes da família que o acolheu, Messala decide se integrar às legiões romanas e se torna um importante comandante do exército de César. Ao retornar para Jerusalém um incidente gera um grave conflito entre os irmãos. Judah é acusado de traição e condenado à escravidão. Ele é enviado para manejar os remos das galés e após passar cinco anos confinado no porão de um navio, consegue escapar e passa a buscar uma forma de vingar o seu nome e a sua família.

Como não sou muito adepto desta onda de refilmagens que tomou conta de Hollywood, pensei seriamente em não assistir a este filme, mas mudei de ideia quando soube que quem estava a frente do projeto era o diretor cazaque Timur Bekmambetov, um cineasta que tem um estilo próprio e talento para dirigir filmes de ação.

Bekmambetov começou a fazer cinema na Rússia e estreou na direção em 1994 com Peshavarskiy Vals, um filme sobre a guerra soviética no Afeganistão, que recebeu prêmios em vários festivais na Europa. Em 2004 ele fez sucesso com Guardiões da Noite, um filme de fantasia sobre vampiros que se tornou um blockbuster na Rússia e ganhou uma continuação dois anos depois chamada Guardiões do Dia. Em 2006 ele dirigiu o seu primeiro filme americano intitulado O Procurado, que contou com um elenco cheio de estrelas (Angelina Jolie, James McAvoy, Morgan Freeman e Terence Stamp) e revelou para o mundo o seu jeito estiloso de fazer filmes de ação.

Realmente é o trabalho do diretor que faz a diferença neste novo Ben-Hur, porque os demais elementos do filme (roteiro, direção de arte, efeitos especiais, figurinos etc) são convencionais e seguem o mesmo padrão dos filmes épicos hollywoodianos mais recentes. Bekmambetov é sempre cuidadoso com os enquadramentos e investe em cenas mais intimistas, dando espaço para diálogos mais longos entre os personagens.

Mas e as sequências de ação, que são a especialidade do diretor? Bem, considero que nesse quesito ele se saiu muito bem, proporcionando ao espectador momentos tensos e frenéticos. Mas curiosamente, não é a tão aguardada corrida de bigas a melhor sequência de ação do filme. Embora ela seja empolgante e muito bem realizada (foram quase quatro meses de preparação e mais seis semanas de gravação), ela é superada pela espetacular sequência da batalha naval entre romanos e gregos no Mar Jônico, esse sim, a meu ver, é o ponto alto do filme.

Com relação ao elenco, embora falte carisma à dupla principal, a decisão de escalar dois atores ainda pouco conhecidos para os papéis principais se mostrou acertada, pois permite que associemos os personagens aos intérpretes com mais facilidade. Os personagens Judah e Messala são interpretados respectivamente por Jack Huston (que é sobrinho de Anjelica Huston e neto de John Huston) e Toby Kebbell (ator inglês visto recentemente em Warcraft: O Primeiro Encontro de Dois Mundos). Entre os coadjuvantes destaca-se mais uma vez Morgan Freeman. É impressionante como o ator veterano sempre consegue passar credibilidade, seja atuando como protagonista ou fazendo pequenos papéis.

Quanto a Rodrigo Santoro que interpreta Jesus Cristo, ele até que se esforça para fazer um bom trabalho, mas a sua participação no filme é tão pequena que ele fica sem condições de desenvolver o seu personagem de forma mais aprofundada.

Outro elemento do filme que vale a pena ser discutido é a trilha sonora de Marco Beltrami. Quem estiver esperando por uma música grandiosa e marcante como aquela que Miklós Rózsa compôs para o Ben-Hur de 1959 vai se decepcionar. Não que a música de Beltrami seja ruim, ela apenas não se destaca no filme, talvez porque os tempos sejam outros e os produtores de agora acreditem que este tipo de trilha sonora mais elaborada esteja fora de moda, "old fashioned" (antiquado) como se costuma dizer, o que é uma pena.

Embora este novo Ben-Hur não se iguale ao clássico de 1959, considerando-se os prós e os contras, o resultado acaba sendo positivo. O filme consegue prender a atenção do espectador na maior parte do tempo, porém perde o fôlego na reta final. Além da já mencionada sequência referente a corrida de bigas ter ficado um pouco aquém das minhas expectativas, a conclusão do filme deixa a desejar: tudo é resolvido de forma superficial e apressada, terminando com um final feliz que soa forçado e pouco convincente. Algo parecido com último capítulo de novela.

Avaliação: Bom. Nota: 7,5/10.

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O Monstro de Mil Cabeças – Uma mulher decide enfrentar o monstro
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 03/08/2016)



A premissa deste filme mexicano não é nova, porém é muito bem desenvolvida pelo diretor Rodrigo Plá: mostra o indivíduo injustiçado que decide confrontar o Sistema. O indivíduo neste caso é uma mulher tentando salvar a vida do marido e o Sistema é representado por uma grande empresa, com os seus interesses econômicos e a sua burocracia. A situação que o filme expõe é a seguinte: um casal paga um plano de saúde durante vários anos, mas quando o marido fica gravemente doente e precisa fazer um procedimento que é novo e caro, a operadora do plano se recusa a custear o tratamento. Desesperada, a esposa decide cobrar os seus direitos junto a empresa.

Explorando com competência um tema de grande apelo emocional e contando com a talentosa atriz Jana Raluy no papel principal, Plá constrói uma atmosfera de tensão crescente, ao mesmo tempo em que cria no espectador uma simpatia pela causa da protagonista. Causa essa que não é muito difícil de ser abraçada, pois quem nunca se sentiu injustiçado ou lesado por uma destas grandes companhias das quais dependemos todos os dias, sejam as operadoras de planos de saúde (como ocorre no filme), as companhias telefônicas, as instituições financeiras, os hospitais, as repartições dos serviços públicos etc? E quem também nunca se sentiu impotente diante dos serviços de atendimento ao cliente dessas empresas, que em muitos casos só enrolam e não resolvem nada? Ou seja, nós não só nos solidarizamos com o drama vivido pela protagonista, que vai até às últimas consequências na sua cruzada para salvar a vida do marido, como também nos identificamos com ele, já que alguns de nós talvez tenhamos passado por situações em nossas vidas nas quais também tivemos vontade de radicalizar e de fazer algum tipo de loucura. E quando há uma vida em jogo então, a situação fica ainda mais dramática.

Além de manter um controle absoluto sobre a narrativa, o diretor ainda demonstra um grande talento para posicionar a câmera em ângulos reveladores e pouco convencionais, sem que isso pareça artificial ou exagerado.

Em algumas partes do filme o nível de tensão fica tão elevado, que eu me surpreendi literalmente prendendo a respiração.

Também me chamaram a atenção alguns recursos narrativos que foram utilizados, tais como: a adição de depoimentos em áudio em determinadas cenas, como se o diretor quisesse dar pistas sobre o desfecho da trama. Outro recurso, usado de forma econômica mas eficaz é o de mostrar uma mesma situação sob mais de um ponto de vista.

O Monstro de Mil Cabeças é um filme objetivo, ágil e que traz alguns momentos impactantes. E mesmo que a tensão acumulada durante a projeção se dissipe após o término da sessão, fica a certeza de que os 74 minutos que passamos dentro da sala escura do cinema valeram a pena. Eu recomendo!

Avaliação: Muito Bom. Nota: 9/10.

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Chocolate – Uma história que vale a pena conhecer
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 28/07/2016)



Embora viesse atuando em produções para o cinema e para a televisão desde o início dos anos 2000, o ator Omar Sy só ficou conhecido pelo grande público em 2011 com o filme Intocáveis. Nesta comédia dramática francesa ele esbanja charme e simpatia ao interpretar Driss, um jovem problemático contratado para cuidar de um ricaço que ficou tetraplégico após sofrer um grave acidente. Mesmo sendo despretensioso, o filme foi um grande sucesso de público, graças principalmente a química perfeita entre os dois atores principais (Sy contracenou com o ator François Cluzet).

Desde então, o ator vem aparecendo em projetos cada vez mais ambiciosos. Em 2013 atuou em A Espuma dos Dias (do diretor Michel Gondry), no ano seguinte interpretou o papel de um imigrante ilegal no filme Samba e em 2015 encarou o seu maior desafio até o momento: interpretar o palhaço Chocolate, o primeiro artista de circo negro da França, que fez muito sucesso no final do século 19.

Descoberto em um pequeno circo no norte da França por George Footit, um palhaço e acrobata britânico, Chocolate formou uma dupla de sucesso com ele, chamada "Footit e Chocolat".

Trata-se de um personagem complexo e o seu intérprete teve a difícil tarefa de fazer o público rir (não só a platéia dos circos e das casas de shows onde Chocolate se apresenta, que é retratada no filme, como também o próprio público que está na sala de cinema), ao mesmo tempo em que tem que lidar com uma pesada carga dramática, pois Chocolate passou por várias situações adversas durante a sua vida, muitas delas decorrentes de preconceito. Ele só foi realmente "aceito" pela sociedade da época enquanto permitiu ser tratado como coadjuvante de um artista branco (no caso o palhaço Footit, seu parceiro) e quando ousou iniciar uma carreira solo (protagonizando uma versão da peça Otelo de Shakespeare) foi duramente criticado e boicotado, como mostra o filme. Seu talento só foi reconhecido mais tarde e entendo que este filme é parte deste reconhecimento.

Cabe aqui uma breve reflexão: se ainda hoje presenciamos casos de preconceito racial quase que diariamente, imaginem então como um negro (ainda mais bem sucedido) era visto na sociedade européia daquela época.

O Chocolate real também era conhecido como Rafael Padilla, na verdade ele nasceu sem um sobrenome, "Padilla" foi apenas um dos vários que ele adotou ao longo de sua vida. Ele nasceu em Cuba em algum momento entre 1865 e 1868 e provavelmente nasceu um escravo, o que explicaria por que seu nascimento não foi registrado. Foi criado por uma mulher negra e pobre nas favelas de Havana e enquanto ainda era um garoto foi vendido por ela para um empresário espanhol chamado Patricio Castaño Capetillo.

Apoiado em um roteiro bem estruturado e no bom ritmo da narrativa, o filme consegue mostrar em 110 minutos de projeção toda a trajetória de Rafael/Chocolate: o início da carreira no circo, o encontro com o palhaço Footit (com quem viria a formar a famosa dupla "Footit e Chocolat"), os dias de glória, os problemas com o jogo e com a bebida, os relacionamentos amorosos e o final da vida melancólico.

Assim como ocorreu em Intocáveis, no drama Chocolate Omar Sy também trabalhou em dupla com outro ator, o suíço James Thierrée, e mais uma vez a química aconteceu. Seja nas cenas em que eles recriam os números circenses dos artistas originais, seja nos momentos de conflito entre os personagens, o talento dos atores e a afinidade entre eles fica evidente.

Além do ótimo trabalho do elenco, que ainda conta com os atores Frédéric Pierrot e Noémie Lvovsky (nomes conhecidos do cinema francês) em papéis coadjuvantes, merecem elogios a direção competente e sensível de Roschdy Zem, a caprichada reconstituição de época e a trilha sonora inspirada de Gabriel Yared (compositor veterano que tem surpreendido a cada novo trabalho).

Chocolate é uma produção de qualidade, traz uma história interessante que vale a pena conhecer e deve agradar ao público em geral. Eu recomendo!

Avaliação: Muito Bom. Nota: 9,5/10.


Foto: A dupla "Footit e Chocolat" do filme e a dupla real.

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Julieta - Almodóvar
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 24/07/2016)



Julieta, o novo filme de Pedro Almodóvar marca o retorno do celebrado diretor espanhol ao gênero drama, depois de uma incursão desastrosa pela comédia, que resultou no terrível Os Amantes Passageiros, de 2013, filme que eu até prefiro esquecer.

O roteiro de Julieta foi escrito pelo próprio Almodóvar, que se baseou em três contos da escritora canadense Alice Munro, vencedora do prêmio Nobel de Literatura de 2013.

A trama já começa em clima de mistério ao introduzir a enigmática Julieta, mulher de meia-idade cuja expressão preocupada e os gestos nervosos sugerem que ela guarda um importante segredo. Nessa fase da vida a personagem é interpretada por Emma Suárez.

Julieta está organizando a mudança de seu apartamento em Madri, pois ela pretende deixar a Espanha e se mudar para Portugal com o namorado Lorenzo. Entretanto, um encontro casual com uma jovem nas ruas de Madri, a faz mudar de ideia. Ela desiste da viagem, se afasta do namorado e se muda para outro apartamento, num local da cidade que parece ter alguma conexão com o seu passado.

Nesse ponto a história retrocede no tempo para mostrar o que ocorreu com Julieta na sua juventude e que parece te-la marcado tanto. A bela Adriana Ugarte assume a personagem nessa outra fase.

Numa viagem de trem a jovem Julieta conhece Xoan, um pescador, com quem acaba se envolvendo, e dessa relação nasce uma filha. A partir daí, Julieta e a filha se tornam o foco central da história e Almodóvar consegue manter o espectador sempre curioso pelo desenrolar da trama.

O diretor também sabe explorar muito bem as locações onde se passa a história, com destaque para uma bela casa a beira-mar, que é um verdadeiro sonho. E tem um detalhe curioso a respeito dessa casa: os azulejos que forram as paredes da cozinha são cópias dos que foram criados pelo artista plástico brasileiro Cândido Portinari para os painéis do Palácio Gustavo Capanema, que fica no Rio de Janeiro.

Além dos cenários, também chama a atenção a trilha sonora composta por Alberto Iglesias (colaborador habitual do diretor), que comenta a narrativa com eficiência e dá um toque de elegância ao filme.

Para finalizar, deixo aqui uma mensagem para os fãs mais ardorosos do diretor: embora Julieta seja um bom filme, ele não está no mesmo nível dos seus trabalhos mais ousados e marcantes, sendo assim, para aprecia-lo melhor é bom não exagerar nas expectativas. Isto posto, desejo a todos uma boa viagem ao universo de Pedro Almodóvar!

Avaliação: Bom. Nota: 8/10.

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Procurando Dory - Muita ação e pouca emoção
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 21/07/2016)



Não teve jeito, acabei assistindo Procurando Dory na versão dublada mesmo. A cidade de Campinas/SP possui quase sessenta salas de cinema, desse total praticamente 1/3 delas estava exibindo a animação. Fazendo uma conta aproximada: com 20 salas exibindo o filme em 3 sessões diárias, daria um total de 60 sessões diárias. Dentre todas essas sessões, sabem quantas exibiam uma cópia legendada? NENHUMA. Considero essa prática dos exibidores um absurdo e uma falta de consideração com a parcela do público que prefere assistir a filmes legendados. O que custaria disponibilizar pelo menos 1 sessão com cópia legendada, mesmo que fosse em um horário menos convidativo?

Fica registrado aqui o meu protesto! Afinal, as animações atuais não se destinam apenas ao público infantil, muitas vezes trazem temáticas complexas que são até mais compreendidas pelos adultos do que pelas crianças, como é o caso por exemplo do recente Divertida Mente. Sendo assim, o público adulto que prefere filmes legendados também tem que ser contemplado. Isso vale para todos os filmes de animação que entrarem em cartaz.

Mas voltando à análise do filme, chama a atenção o fato de que esta sequência do sucesso Procurando Nemo demorou 13 anos para ser realizada. É que, nesse período de tempo o diretor/escritor Andrew Stanton, responsável por ambos os filmes, esteve envolvido com outras produções tais como: John Carter: Entre Dois Mundos, WALL-E e Toy Story 3.

Amparado por uma grande campanha de lançamento, Procurando Dory já se tornou um sucesso de bilheteria, arrecadando mais de 135 milhões de dólares no seu primeiro fim de semana de exibição nos Estados Unidos, superando a marca do seu antecessor.

Mas isso significa que o filme é muito bom? Não exatamente.

Se compararmos Procurando Dory com as outras animações com as quais o diretor esteve envolvido, constatamos que desta vez lhe faltou inspiração. A história centrada na peixinha que sofre de perda da memória recente se mostrou menos cativante do que a do pequeno peixe-palhaço do primeiro filme, por exemplo. Nemo, o peixinho com deficiência que foi apanhado por humanos e depois resgatado, encantou a todos e ainda trouxe ensinamentos importantes sobre amizade e sobre como encarar os desafios da vida.

Nessa sequência, Dory empreende uma jornada em busca de seus pais desaparecidos, contando com a ajuda de velhos e novos amigos, entre eles: Marlin e Nemo (os peixes-palhaço protagonistas do primeiro filme, agora relegados a segundo plano), o polvo Hank, o tubarão-baleia Destiny e a beluga Bailey. A trama toda se resume a essa busca, e praticamente não sai disso. Sem ter muita história para contar, o jeito foi investir na ação desenfreada para tentar prender a atenção do público. Com as crianças essa tática deve funcionar, já os adultos talvez sintam falta de algo mais.

Com esse escopo limitado, a trama acaba se tornando repetitiva, deixando a impressão de que a personagem Dory funcionou melhor como coadjuvante no primeiro filme do que como protagonista nessa continuação. Procurando Dory tem poucos momentos marcantes, até o aguardado reencontro de Dory com os pais deixa a desejar, pois acontece de forma abrupta e sem emoção. Diante disso o filme acaba chamando a atenção mesmo pelas suas qualidades técnicas - a animação é bem produzida e o visual é caprichado, destacando-se as cores, os movimentos perfeitos dos peixes enquanto nadam e a riqueza de detalhes do ambiente marinho.

Enquanto Procurando Nemo permanece na memória de quem o assistiu, mesmo passados tantos anos, Procurando Dory deve ser esquecido mais rapidamente (até por quem não sofre de perda da memória recente) pois não vai além de um passatempo para o público infantil.

Avaliação: Regular. Nota: 6/10.

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Como Eu Era Antes de Você - Mais um livro que é transformado em filme
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 03/07/2016)



Os estúdios norte-americanos estão cada vez mais atentos aos grandes sucessos do mercado literário e quando um livro vira best-seller é quase inevitável que ele se transforme em filme. Foi assim com A Menina que Roubava Livros, A Culpa é das Estrelas, Cinquenta Tons de Cinza, só para citar alguns casos.

Pois bem, a bola da vez é a produção Como Eu Era Antes de Você, baseada num livro escrito pela inglesa Jojo Moyes, que também assina o roteiro da versão cinematográfica. O livro ficou em primeiro lugar nas principais listas de best-sellers da Inglaterra, onde vendeu mais de 500 mil exemplares e teve os seus direitos de publicação negociados para 28 países.

A história gira em torno da relação entre Will Traynor, um rapaz rico e bem sucedido, que após sofrer um acidente fica tetraplégico e Louisa Clark, moça simples e simpática, que é contratada para cuidar do rapaz. Necessitando de dinheiro para ajudar a sua família, Louisa a princípio se submete ao comportamento agressivo de Will, mas com o passar do tempo ela consegue conquista-lo e no final eles acabam se envolvendo.

Os executivos dos estúdios já perceberam que filmes baseados em livros badalados quase sempre fazem sucesso. Mas se por um lado essa estratégia se tornou uma garantia de lucro para os estúdios, por outro, os filmes nem sempre se mostram a altura da expectativa criada.

As produções mais recentes que assisti, baseadas em best-sellers, me deixaram a impressão (negativa) de que, certos de que o filme será tão bem sucedido nas bilheterias como o livro foi em vendas, os realizadores acabam se acomodando e não se esforçam para entregar um trabalho realmente de qualidade. É como aquele aluno que estuda apenas o suficiente para garantir a média que ele precisa e não para tirar um 10 na prova.

Desconfio que por trás disso esteja o seguinte pensamento: se o sucesso de bilheteria já está mais ou menos garantido, pois quem leu o livro vai querer assistir o filme, e mesmo quem não leu, também vai acabar indo por curiosidade, então porque se preocupar em fazer algo mais elaborado? Afinal, todo mundo vai acabar assistindo mesmo.

No caso de Como Eu Era Antes de Você entregaram o projeto nas mãos de uma diretora estreante (Thea Sharrock) que escolheu o pior caminho possível para arrancar risos e lágrimas do público: clichês e mais clichês, situações forçadas e uma trilha sonora repleta de canções de apelo sentimental.

Para protagonizar o longa, selecionaram dois atores bonitos, capazes de seduzir o público alvo do filme, mas que entregam interpretações superficiais. A atriz principal Emilia Clarke (marcante como a princesa Daenerys Targaryen da série Game of Thrones) abusa das caretas e se torna um presença irritante ao longo do filme. Já o ator Sam Claflin se esforça para passar o drama do personagem, mas não consegue atingir a profundidade que o papel necessita.

Mas então, porque muitas pessoas saem chorando depois da sessão? Boa pergunta. Confesso que não sei a resposta, porque o filme não me envolveu em nenhum momento.

Como eu não li o livro no qual se baseou o filme, não tenho como comparar as duas obras. Mas posso opinar o seguinte: se o livro for ruim, então filme e livro se merecem, mas se o livro for bom, então lamentavelmente o estúdio estragou um bom material.

Avaliação: Ruim. Nota: 3/10.

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A Vingança está na Moda - Essa moda não vai pegar
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 31/05/2016)



Tenho certeza de que eu não me esquecerei desse filme, já que foi um dos piores filmes que assisti nos últimos anos. Também pretendo guardar bem o nome da diretora, Jocelyn Moorhouse, para poder me precaver com relação aos seus próximos trabalhos.

A Vingança está na Moda conta a história de Tilly Dunnage (Kate Winslet), uma moça que após viver muitos anos na Europa, decide retornar à sua pequena cidade natal na Austrália para acertar as contas com o seu passado. Quando criança ela foi acusada de assassinar um garoto e por isso foi expulsa da cidade. Tendo se tornado numa mulher atraente e bem sucedida ela pretende encarar novamente as pessoas que lhe fizeram mal.

É difícil enquadrar esse filme em um gênero específico, pois não é um drama, nem uma comédia, nem um romance ... É apenas um filme esquisito, com personagens esquisitos, que aliás são interpretados de forma bastante caricata.

O roteiro da própria diretora em parceria com P. J. Hogan, baseado num livro de Rosalie Ham, não tem pé nem cabeça e mistura vários assuntos diferentes, tais como moda (a personagem principal é estilista), um assassinato a ser desvendado, e para completar ainda traz um romance totalmente inverossímil entre Tilly e Teddy (Liam Hemsworth), o bonitão da vizinhança. O único personagem que provoca alguma curiosidade é o delegado gay da cidade, interpretado por Hugo Weaving (o agente Smith de Matrix) mas ainda assim o potencial cômico do papel é pouco explorado pela diretora. Os diálogos também são bastante ruins, refletindo os absurdos do roteiro.

Excessivamente longo, principalmente por contar uma história tão desinteressante, esse é um daqueles filmes que fazem a gente sair do cinema com vontade de pedir o dinheiro do ingresso de volta.

Avaliação: Péssimo. Nota: 0/10.

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Mais Forte Que Bombas - Emoções contidas
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 20/05/2016)



A famosa fotógrafa e correspondente de guerra Isabelle Reed (Isabelle Huppert) morre em um acidente de carro, deixando marido, dois filhos e algumas questões familiares mal resolvidas. A natureza do seu trabalho a havia transformado em uma mulher dividida, que tentava encontrar o equilíbrio entre as exigências da profissão e as necessidades da família.

Adotando uma narrativa não linear, que mescla acontecimentos do passado e do presente, o filme vai revelando aos poucos quem foi Isabelle e quais as consequências que a sua morte trouxe para a sua família.

Os constantes períodos de ausência da fotógrafa impunham sacríficios tanto para ela como para os seus familiares. Em uma das cenas referentes ao passado, vemos Isabelle se despedindo do marido Gene (Gabriel Byrne) no aeroporto. Pouco antes de partir ela diz ao marido que ele é um homem de sorte porque tem tudo, ao que ele responde: “Eu tenho tudo, só não tenho você”. Logo depois ele acena para a esposa, vira as costas e vai embora, são gestos mecânicos de alguém que já se acostumou com as despedidas. Outra cena importante mostra Isabelle retornando de mais uma longa viagem de trabalho e ao chegar em casa ela se sente deslocada naquele ambiente, como se sua família não precisasse mais dela.

Após a sua morte, entretanto, fica claro que essa percepção não era verdadeira. Quando a história volta para o presente, algum tempo depois do acidente, encontramos a família de Isabelle ainda atordoada, tentando lidar com a perda.

Enquanto o marido Gene tem dificuldade para reconstruir a sua vida amorosa, mantendo um relacionamento as escondidas com uma colega de trabalho, provavelmente temendo a desaprovação dos filhos, esses, por sua vez, guardam sentimentos reprimidos que se manifestam de várias formas. Conrad (Devin Druid), o filho caçula se torna um adolescente retraído que se refugia constantemente em jogos de computador, enquanto que o filho mais velho Jonah (Jesse Eisenberg, numa interpretação mais contida que o seu habitual) demonstra imaturidade diante da responsabilidade de ter se tornado um chefe de família. Quando ele larga a mulher e o filho recém-nascido e viaja para a casa dos pais com o pretexto de organizar o acervo de fotos e documentos deixados pela mãe, é como se ele estivesse procurando a proteção do “colo” materno.

Mais Forte Que Bombas é um drama intimista, dirigido pelo norueguês Joachim Trier (de Oslo, 31 de Agosto) que traz personagens que se expressam quase sempre de forma sutil, razão pela qual o espectador deve observa-los com atenção. Aliás, essa característica está presente também nas interpretações contidas dos atores. Um bom exemplo dessa sutileza é a mudança que ocorre no comportamento de Conrad, o filho caçula, pouco antes do final do filme. Depois de ler um artigo de jornal que traz uma revelação sobre a morte da mãe, ele muda de repente de atitude com relação ao pai. O que pode parecer a princípio uma solução forçada para reconciliar pai e filho, na verdade é resultado de um processo interno vivido pelo personagem, só que esse processo fica implícito, cabendo ao espectador percebe-lo.

Embora esse e outros conflitos tenham um encaminhamento no desfecho da trama, o diretor Joachim Trier deixa o final em aberto. A última cena mostra o pai e os filhos seguindo de carro por uma rodovia, a camera os acompanha até um certo ponto e depois deixa que eles se afastem até que desapareçam da nossa visão.

Também é importante observar que apesar de Mais Forte Que Bombas ser um projeto com muitas qualidades, ele apresenta algumas falhas: o fato dos personagens serem tão contidos, acaba criando um certo distanciamento entre eles e o espectador. Além disso, a direção de Trier é calculada demais e acaba engessando o filme. Essas falhas podem fazer com que o longa tenha uma recepção fria por parte do público.

Avaliação: Bom. Nota: 7/10.

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Meu Amigo Hindu - Filme autobiográfico do diretor Hector Babenco
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 17/03/2016)



Era o meu último dia na Mostra Internacional de Cinema de SP de 2015 e o filme que iria fechar a minha participação no evento era justamente Meu Amigo Hindu, de Hector Babenco, para o qual eu já tinha comprado o ingresso com antecedência. Acontece que, conferindo a programação normal dos cinemas, vi que no mesmo horário, em outra sala, seria exibido o filme A Pele de Vênus de Roman Polanski que eu também estava louco para assistir e essa seria a última chance que eu teria de vê-lo, já que estava em seus últimos dias de exibição. Fiquei em dúvida sobre qual dos dois filmes escolher.

Tomei enfim a minha decisão ao ler uma resenha bastante negativa sobre o filme do Babenco, escrita por um crítico que tinha assistido ao filme na abertura da Mostra. Diante disso, optei por assistir ao filme do Polanski.

Passaram-se quase cinco meses, Meu Amigo Hindu estreou nos cinemas, e eu pude finalmente assisti-lo.

Confesso que fui ver o filme com um pé atrás (como se costuma dizer), ainda influenciado por aquela crítica negativa que li sobre ele. Além disso, os últimos trabalhos de Hector Babenco não tinham me agradado muito, especialmente Carandiru.

Sendo assim, acompanhei as primeiras cenas de Meu Amigo Hindu com desconfiança, mas aos poucos o filme foi me envolvendo, até que eu me vi completamente absorvido pela maneira com que o diretor conta a sua própria história. Sim, trata-se de um filme autobiográfico, que narra uma passagem da vida de Babenco em que ele esteve a beira da morte, vítima de um câncer extremamente agressivo. Meu Amigo Hindu nasceu dessa experiência e assim como o diretor relata no filme, ele não queria morrer porque queria fazer mais esse filme.

Coube ao experiente Willem Dafoe interpretar Hector Babenco (que no filme se chama Diego Fairman), e a maneira como o ator se entrega ao papel é admirável, assumindo inclusive as características físicas que um doente de câncer costuma apresentar (o ator emagreceu bastante e raspou os cabelos). É preciso registrar também que a escalação de Dafoe, um ator estrangeiro, para o papel principal, obrigou o restante do elenco (formado na maioria por atores brasileiros) a falar inglês. Mas o fato do filme tratar de pessoas que vivem no Brasil e ser falado em inglês não chega a incomodar.

Apesar de grande parte da história se concentrar na doença do diretor e na possibilidade de sua morte, Meu Amigo Hindu não é um filme pesado, graças as soluções criativas que o diretor encontrou para lidar com esses assuntos penosos. Uma delas foi a inclusão de um personagem fantástico que é uma espécie de mensageiro da morte, ele é apresentado como um funcionário de uma empresa do além, cujo trabalho é levar as pessoas para o outro lado quando elas morrem. Interpretado por Selton Melo com o seu habitual carisma, esse personagem foi um grande achado e os diálogos entre o mensageiro que vem buscar o doente moribundo e o doente que se recusa a partir são impagáveis. A outra solução utilizada para amenizar o clima do filme refere-se justamente ao amigo hindu do título, uma criança indiana que compartilha as sessões de quimioterapia com o personagem de Babenco. Para tentar amenizar a opressão da sala onde recebem os medicamentos (apesar do local ser decorado com belos papéis de parede) os dois desenvolvem uma relação de cumplicidade, na qual dividem muitas histórias (algumas delas parecem até se transformar em realidade) e essa relação entre eles acaba trazendo um toque de fantasia para a narrativa.

Que privilégio ser diretor de cinema e poder fazer um filme autobiográfico no qual você pode passar a sua própria vida a limpo. Que fantástico conseguir fazer por meio de um filme um exame de consciência, acertar as contas consigo mesmo e com as pessoas que o cercam, e até adicionar um toque de magia a tudo isso, como só o cinema permite fazer.

Para nós, espectadores do filme, que não somos cineastas, só nos resta admirar e invejar a oportunidade e a disposição que Hector Babenco teve para fazer esse filme. Mas nós, que não somos cineastas, também podemos fazer o nosso exame de consciência íntimo e tentar da melhor maneira possível, mesmo sem utilizar essa poderosa ferramenta que é o cinema, passar as nossas próprias vidas a limpo.

Em Meu Amigo Hindu, Hector Babenco nos convida a compartilhar de uma parte da sua vida, mas também nos presenteia com momentos de pura magia cinematográfica, como a cena final que traz a atriz Bárbara Paz dançando ao som da canção de “Cantando na Chuva”.

Avaliação: Muito bom. Nota: 9/10.

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Boa Noite, Mamãe! - Jogo de aparências macabro
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 15/03/2016)



Filme de terror austríaco que se utiliza de várias referências cinematográficas para construir a sua trama. A primeira dessas referências, e para mim a mais evidente, é um filme americano de 1972 chamado A Inocente Face do Terror (The Other). Ambos trazem como protagonistas dois garotos, irmãos gêmeos, muito ligados entre si, sendo que um deles tem um comportamento mais dominante com relação ao outro e vou parar por aqui com as comparações para não entregar um importante detalhe da história. Mas Boa Noite, Mamãe! também flerta com filmes como O Sexto Sentido e com o estilo de violência encenado por Michael Haneke em Violência Gratuita.

Mas a boa notícia é que apesar do filme se valer de todas essas referências, ele tem personalidade própria. Consegue criar um interessante jogo de aparências, no qual o que é mostrado nem sempre (ou quase nunca) corresponde à realidade. É que a noção de “realidade” nesse filme é muito relativa, pois são lançadas várias possibilidades e em consequência disso é provável que cada espectador faça a sua própria leitura do filme.

Só para dar uma ideia, eu assisti ao filme acompanhado de dois amigos e no final da sessão cada um teve uma interpretação diferente da história.

Tudo começa quando a mãe dos gêmeos (mencionados no início desse texto) volta para casa com o rosto todo enfaixado depois de passar por uma cirurgia. O fato de não conseguirem ver o rosto da mãe, aliado ao comportamento estranho dela, gera uma espécie de paranoia nos meninos, que passam a desconfiar de que aquela mulher é uma impostora. Em sua primeira parte, o filme reforça essa ideia, explorando principalmente a aparência da mãe, cuja máscara e as bandagens que lhe cobrem o rosto lhe dão um aspecto assustador. Mas depois, em sua segunda parte, há uma inversão interessante na história, que faz com que o espectador passe a encarar os gêmeos como ameaça e não mais a mãe deles.

Para aumentar ainda mais o clima de tensão, tudo se passa numa casa isolada, localizada numa região rural da Áustria.

Boa Noite, Mamãe! que a princípio desperta curiosidade por ser um filme de terror europeu, tem muito a oferecer aos fãs do gênero, desde uma trama que prende a atenção o tempo todo, até sequências que vão mexer com os nervos das pessoas mais sensíveis na plateia. Eu recomendo.

Avaliação: Bom. Nota 8,5/10.

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A Bruxa - Produção independente que ganhou o prêmio de melhor direção no Sundance Film Festival 2015
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 12/03/2016)



Atenção fãs de filmes de terror, não esperem por sustos ou pela violência gráfica dos filmes de terror atuais. Quem for assistir A Bruxa deve ter em mente que se trata de uma produção independente, pela qual o diretor estreante Roger Eggers ganhou o prêmio de melhor direção no Sundance Film Festival 2015.

A Bruxa é praticamente um filme de época, no qual o andamento da trama, os diálogos e a ambientação nos remetem de maneira bastante realista ao período e ao local em que a história se passa, em outras palavras, o espectador é transportado para a região da Nova Inglaterra nos Estados Unidos, em plena década de 1630, período da colonização do país.

O filme narra a história de uma família de puritanos ingleses que são expulsos da comunidade onde vivem devido a divergências religiosas. O casal e seus cinco filhos partem em busca de uma nova morada e acabam se instalando numa clareira perto de uma floresta. O que eles desconhecem é que a floresta é habitada por bruxas. Como se não bastasse a luta diária para sobreviver em um lugar inóspito, eventos inexplicáveis e assustadores começam a afligir a família.

Para construir a trama o diretor buscou inspiração em documentos históricos e relatos populares derivados da histeria de "caça às bruxas" que assolou os Estados Unidos e a Europa no século XVII. Esse foi um período em que o radicalismo religioso aliado as superstições levaram muitas pessoas a serem acusadas de praticar bruxaria, sendo que muitas delas foram condenadas à morte. Houve até um episódio que se tornou bastante conhecido: um julgamento que ocorreu no povoado de Salem, Massachusetts, em 1692. As mulheres que foram julgadas ficaram conhecidas como “As Bruxas de Salem”.

Essa base histórica torna A Bruxa ainda mais interessante, pois constatamos que o filme funcionaria mesmo sem os elementos sobrenaturais que são adicionados à história.

Ou seja, a combinação de vários fatores como radicalismo religioso, superstições, medo, isolamento e luta pela sobrevivência, já seria suficiente para desestabilizar psicologicamente a família retratada no filme. O diretor poderia até ter deixado em aberto, para que o espectador decidisse, se os acontecimentos mostrados no filme eram realmente de origem sobrenatural ou fruto da mente dos personagens, submetidos a uma situação de grande estresse. Eggers no entanto deixa claro que, além de todos esses fatores que foram mencionados, a família também está sendo vítima de forças malignas que habitam a floresta vizinha.

Nesse aspecto o diretor consegue trabalhar muito bem com os elementos sobrenaturais da história, criando imagens e situações que se tornam verossímeis na medida em que encontram correspondência no imaginário coletivo, no que diz respeito a rituais de magia e histórias de bruxas. Além disso, Eggers insere comentários sutis sobre como a religião pode aprisionar o indivíduo em alguns casos, incutindo nele uma noção exagerada de pecado e levando-o a sentir culpa e à necessidade de expiar essa culpa por meio de castigos.

Diferente de grande parte das produções atuais do gênero, que são feitas para provocar reações imediatas na platéia, A Bruxa é um filme que é “metabolizado” de forma mais lenta pelo público. Investe num terror mais sugerido do que explícito, e as suas principais táticas para manter a curiosidade do espectador são justamente o ritmo lento, os diálogos extensos mas cheios de significados e a construção de uma atmosfera ameaçadora, respaldada pela fotografia escurecida de Jarin Blaschke e pela trilha sonora sinistra de Mark Korven.

O resultado de tudo isso não é exatamente um filme aterrorizante como está sendo anunciando, mas um filme marcante, que permanece no pensamento, mesmo depois de terminada a sessão. E a maior prova disso é que eu quis assisti-lo mais de uma vez.

Curiosidades: por trás desse projeto está o produtor brasileiro Rodrigo Teixeira e o elenco conta com dois atores da série Game of Thrones (Kate Dickie, a Lysa Arryn da série, e Ralph Ineson, o Dagmer Cleftjaw).

Avaliação: Muito bom. Nota 9/10.

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Trumbo - Lista Negra - Filme retrata personalidade polêmica, mas evita polemizar
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 04/03/2016)



Dirigido de forma bastante convencional por Jay Roach, um cineasta mais habituado a fazer comédias, Trumbo - Lista Negra é um filme que fica aquém da personalidade que ele retrata: o escritor e roteirista vencedor do Oscar Dalton Trumbo, responsável pelos roteiros de filmes como Spartacus, Exodus, Johnny Vai à Guerra, Papillon, entre outros.

Trumbo foi perseguido após se declarar comunista, no período em que vigorava a Guerra Fria entre os Estados Unidos e a extinta União Soviética. Em 1947, ele e outros nove diretores e roteiristas foram chamados para depor na comissão parlamentar de inquérito da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos formada para averiguar a suposta infiltração de comunistas na indústria de cinema e presidida pelo senador Joseph McCarthy. Trumbo se recusou a delatar os companheiros e pagou caro por isso. Ele chegou a ser preso e durante muitos anos teve que trabalhar utilizando pseudônimos.

No que diz respeito ao filme, é provável que a pouca experiência do diretor Jay Roach em dirigir dramas (de seus doze filmes anteriores, dez são comédias) tenha influenciado na adoção de um tom equivocado para narrar a história, pois além de suavizar demais a reconstituição dos fatos (inclusive as passagens mais graves, como a ida de Trumbo para a prisão), ele exagera no emprego de alívios cômicos durante a narrativa (a cena em que o produtor de filmes baratos Frank King bota um sujeito para correr de seu escritório é um bom exemplo disso). Mas não é só nesse ponto que a produção peca, para um filme que retrata um dos grandes roteiristas do cinema americano, era de se esperar um roteiro a altura, entretanto o que se vê é um trabalho pouco elaborado e convencional.

O competente ator Bryan Cranston, que fez sucesso na televisão como protagonista da série Breaking Bad, faz um bom trabalho na caracterização do personagem, mas a sua interpretação nunca consegue atingir o nível máximo de dramaticidade, pois o tom suave da narrativa não permite. No elenco ainda temos outros nomes de peso como Helen Mirren e Diane Lane.

A impressão que fica é que os produtores perceberam que essa fase da vida de Dalton Trumbo daria um ótimo argumento para um filme, mas não quiseram polemizar, talvez para poupar os envolvidos, já que muitos deles são nomes conhecidos da indústria cinematográfica.

Que um filme evite criar polêmica ou queira manter uma certa neutralidade sobre um determinado assunto é até compreensível, o que não é aceitável é a tentativa de amenizar a gravidade dos fatos, ainda mais quando esses fatos quase destruíram as carreiras e as vidas dos envolvidos. Ao tratar de forma superficial a questão das perseguições sofridas por profissionais da indústria cinematográfica americana naquela época, o filme perde força e acaba se tornando mais uma dessas cinebiografias de personalidades famosas que Hollywood adora fazer.

No final, o filme tenta se redimir por meio de um discurso emocionado do personagem principal, mas ainda assim fica a impressão de que os fatos (posições políticas à parte) mereciam ter sido abordados de uma maneira mais contundente.

Avaliação: Regular. Nota: 6,5/10.

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Presságios de um Crime - Produção americana comandada pelo diretor brasileiro Afonso Poyart
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 02/03/2016)



A produção cinematográfica está cada vez mais globalizada e como resultado disso vários cineastas brasileiros estão fazendo carreira internacional, seja por meio de co-produções com outros países, seja dirigindo filmes para estúdios americanos. Fernando Meirelles, José Padilha e Walter Salles são alguns dos diretores que trilharam esse caminho.

Em 2015 um outro diretor brasileiro entrou para esse grupo, trata-se de Afonso Poyart, que até então tinha dois filmes no currículo: o curta Eu Te Darei o Céu e o longa 2 Coelhos.

Poyart foi contratado para dirigir a produção americana Presságios de um Crime (Solace), na qual teve que trabalhar com dois astros do cinema, Anthony Hopkins e Colin Farrell.

Se por um lado esse projeto possibilitou um grande salto na carreira do diretor, ou seja, a chance de trabalhar na maior e mais influente (embora não necessariamente a melhor) indústria de cinema do mundo, por outro lado representou um enorme desafio para Poyart. E não estou me referindo ao fato dele ter que comandar uma grande produção ou lidar com astros famosos, o grande desafio de Poyart foi tentar fazer um filme interessante a partir de um roteiro extremamente ingrato (para não dizer ruim). A premissa do filme já é bastante conhecida: agentes do FBI tentam encontrar e prender um serial killer antes que ele faça novas vítimas. Se você teve a impressão de já ter visto essa história antes, pode acreditar que já viu mesmo, e inúmeras vezes.

A pequena diferença nesse caso é que não se trata de uma dupla de agentes, como normalmente acontece, mas um trio, sendo que um deles tem poderes de clarividência. É Anthony Hopkins quem faz o papel do vidente, que após ficar vários anos afastado devido a uma tragédia pessoal retorna à ativa para ajudar na resolução de um caso difícil. O ator, com os seus gestos pausados e com um olhar penetrante à la Dr. Hannibal Lecter (o seu personagem em O Silêncio dos Inocentes) domina o filme, e o fato dele ser também um dos produtores me faz pensar que esse filme foi feito sob encomenda para ele. Só faltou encomendar um roteiro melhor, que trouxesse alguma novidade para esse gênero já tão explorado.

Quem assistiu ao filme anterior do diretor Afonso Poyart, 2 Coelhos, sabe que ele é um cara criativo, e ele tentou na medida do possível fazer de Presságios de um Crime um filme interessante, construindo um clima de mistério, caprichando nas sequências de ação, utilizando uma montagem frenética na parte final do filme, na tentativa de deixar o fraco desfecho um pouco mais emocionante, mas apesar de todos esses esforços o resultado final foi apenas regular. Com uma trama confusa, que apela para vários clichês do gênero, Presságios de um Crime é um exemplo de que ter um diretor competente e um bom elenco num filme nem sempre é garantia de um bom resultado final, é preciso antes de mais nada ter uma boa história para contar.

Avaliação: Regular. Nota: 6/10.

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Boi Neon - A vida sonhada e a vida real
(Por Alexandre Arroyo, publicado em 24/01/2016)



A história tem como cenário as "Vaquejadas", uma espécie de rodeio característico da região nordeste do Brasil no qual dois vaqueiros a cavalo conduzem um boi dentro de uma arena até derrubá-lo puxando-o pelo rabo.

Mas o evento, embora interessante, é apenas um pano de fundo, pois o objetivo principal do diretor é mostrar a vida daqueles que estão por trás do espetáculo. É nesse universo que encontramos o vaqueiro Iremar, que cuida dos animais e ajuda nos rodeios, mas deseja se tornar um estilista, a caminhoneira Galega, que além de transportar a equipe e os bois, também faz shows eróticos fantasiada com uma cabeça de cavalo e a sua filha Cacá, cujo maior sonho é ter um cavalo de estimação.

Assim como fez em seu longa anterior Ventos de Agosto, o diretor Gabriel Mascaro procura se comportar como um observador dos personagens, evitando conduzi-los para esse ou aquele destino. Isso se reflete na narrativa, que não segue o modelo tradicional de "começo, meio e fim", mas é composta por passagens que buscam retratar o cotidiano daqueles personagens.

Numa cena em que a menina Cacá manifesta o seu desejo de ter um cavalo, a mãe responde: "essa menina só quer aquilo que ela não pode ter". Essa frase define a essência de Boi Neon, ou seja, é um filme sobre pessoas que estão presas a uma dura realidade, que tem sonhos, mas pouca ou nenhuma oportunidade de concretiza-los (mais um ponto em comum com a temática de Ventos de Agosto). E essa distância entre a vida sonhada e a vida real é simbolizada de forma sutil pela imagem do boi que antes de ser empurrado para a arena é coberto por luzes de neon, cena essa que ilustra o cartaz do filme.

Boi Neon é mais um bom exemplar do cinema nacional que chega às telas, vencendo a difícil barreira que os filmes brasileiros mais autorais encontram para serem distribuídos e merece ser conferido.

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